segunda-feira, outubro 02, 2006

União e dedicação pelos negócios

É notório que uma empresa de origem familiar conta com elementos únicos em sua formação e desenvolvimento em comparação às demais companhias. Apesar de contarem com algumas necessidades especiais, essas empresas são as que mais duram no mercado. De acordo com o presidente da Owner Managed Business Institute e maior autoridade mundial em Gestão de Empresas Familiares, o professor John Davis, as companhias de origem familiar tendem a durar mais do que as demais, devido, principalmente, à unidade entre os parentes. O acadêmico proferiu nesta quinta-feira, 28 de setembro de 2006, palestra sobre o tema pelo Special Management Program, realizado pela HSM, no Hotel Transamérica, em São Paulo.
Segundo ele, porém, há alguns elementos que são essenciais para que uma companhia familiar de sucesso consiga se manter por um bom tempo no mercado, sem sofrer com um problema que é típico neste tipo de empreendimento: a perda de valor da firma durante a sucessão entre as diferentes gerações. "Uma empresa familiar de sucesso preza pela unidade entre as pessoas e uma dedicação única ao bem da companhia e à boa sorte do empreendimento", disse o professor.
Segundo ele, outros elementos importantes a serem levados em conta por uma companhia com essas características são os seguintes:
- Propriedade e administração estáveis
- Líderes nativos e "vigorosos"
- Pensamento em longo prazo
- Missões ambiciosas
- Cultura com valores claros
- Lealdade
- Transições acertadas
Expectativas díspares e normas de igualdade - Se por um lado uma empresa familiar tem a vantagem de quase sempre durar mais no mercado que suas concorrentes, por outro enfrenta alguns problemas internos que, caso não sejam bem administrados, podem levá-la ao colapso rapidamente. "Numa empresa desse ramo, a família depende do negócio. Assim, os problemas começam a acontecer a partir do momento que o gestor se esquece de administrar as expectativas dos funcionários e membros da família", alerta Davis.
De acordo com o professor, diferentes expectativas dentro de uma companhia familiar acarretam, quase que inexoravelmente, em problemas sérios de relacionamento e, conseqüentemente, numa quebra da união dentro da empresa. Outro risco grande são as normas de igualdade. Esse fator nada mais é do que a noção familiar de divisão igualitária dos bens entre irmãos, primos etc. "Isso acarreta em um sério problema a partir do momento em que funcionários que fazem mais passam a reclamar de outros que trabalham menos, mas têm as mesmas vantagens", explica o professor.
Também são problemas típicos de uma empresa desse tipo:
- Impostos sobre o patrimônio
- Ausência de sucessores capazes
- Falta de trabalho em equipe
- Falta de planejamento
- Dificuldade dos trabalhadores em abrir mão de seus postos
- Longevidade crescente
Padrões de Barcelona - Em meio a tantos entraves, como desenvolver uma estratégia coerente para evitar um naufrágio precoce do empreendimento familiar? John Davis trouxe aos congressistas um exemplo radical de uma companhia de Barcelona no sentido de resolver problemas de cunho pessoal entre os familiares. O que ficou conhecido como "Padrões de Barcelona" são as normas que essa companhia criou no sentido de exigir dos membros da família requisitos mínimos para que possam tentar um cargo dentro da empresa. Dentre eles, está ter mais de 25 anos; falar no mínimo três idiomas; ter curso superior; ter apenas uma oportunidade de pleitear um cargo; e apresentar boa experiência em gestão.
A conseqüência disso foi o fim do nepotismo dentro da empresa, assim como das relações de ciúmes entre os funcionários. "Os membros da família pararam de reclamar uns dos outros, acabando assim com toda ciumeira", contou Davis. "Eles viram que quem entrou na companhia foi por méritos próprios e quem não estava disposto a se esforçar parou de reclamar", concluiu.
Conselho administrativo - De acordo com o professor, uma empresa familiar necessita decisivamente de um conselho administrativo para supervisionar o trabalho. Davis exemplificou que, enquanto os gerentes da companhia têm uma visão abrangente, correspondente a 15 metros acima do chão, e o CEO, de 30 metros, o conselho administrativo tem de apresentar um olhar acima dos 10.000 metros.
"Mesmo o CEO, que é uma pessoa que deveria estar direcionada a um pensamento estratégico global da companhia, é sempre requisitado para resolver problemas internos, restando-lhe pouco tempo para desenvolver esse tipo de visão", analisou o professor. "Assim, esse conselho tem papel fundamental no futuro da empresa", concluiu.
De acordo com Davis, menos de 10% dos membros desse conselho deve ser de familiares, a fim de evitar elementos sentimentais e objetivos pessoais nas decisões. "Esse conselho tem papel fundamental, pois analisa com uma visão abrangente não só a atuação geral da empresa, como também julga o trabalho do CEO", explicou.
Porém, mesmo com toda essa autonomia conferida ao conselho, a família não perde o poder da empresa. "Caso as decisões do conselho não estejam agradando aos familiares, ou melhor, não estejam trazendo os resultados esperados, o dono da companhia pode reunir o corpo de acionistas e decidir pela mudança dos membros do conselho", revelou.
Tríade familiar - Num esforço importante de análise, John Davis trouxe aos participantes um gráfico que separa as empresas familiares em três setores: família, propriedade e negócios. Segundo o acadêmico, professor da Young Presidents’ Organization (YPO), as escolas de administração em todo o mundo dedicam 95% de seu conteúdo programático para os negócios, deixando de lado a análise quanto à gestão da família e da propriedade. "Cerca de dois terços das empresas em todo o mundo são de origem familiar. É essencial para que elas pensem de maneira integrada dentro desses três itens para obter sucesso", advertiu.
Segundo o professor, apenas um trabalho específico e bem fundamentado nos elementos "família" e "propriedade" podem fazer com que as empresas se livrem de mitos internos, como "familiares e profissionais de fora são tratados igualmente" que, segundo ele, é algo que nunca existiu. "É preciso aceitar a idéia de que uma organização familiar é regida por outros elementos que não apenas os negócios e, a partir daí, estruturar a empresa para lidar com esses fatores", concluiu.
Desafios para uma sucessão acertada
Um dos maiores desafios - senão o maior - enfrentado por uma empresa de origem familiar é o momento da sucessão. Estudos apontam que a maioria dessas companhias não sobrevive à terceira geração. Tal fato dá margem para uma série de ritos populares, que dão conta da "impossibilidade" de uma empresa seguir adiante com prosperidade após a saída de seu criador e mentor.
Porém, são apenas de mitos. Com um planejamento bem-estruturado e um pensamento estratégico para enfrentar a situação, a passagem de bastão dentro de uma companhia familiar pode ser bem menos traumática, e melhor: até benéfica para o futuro da empresa.
De acordo com o professor John Davis, considerado a maior autoridade mundial em Gestão de Empresas Familiares, um dos maiores erros cometidos pelos donos das empresas no momento da sucessão é supor que as próximas gerações devem, obrigatoriamente, compartilhar dos mesmos sonhos e objetivos deles. "Os proprietários se importam em desenvolver o talento de seus sucessores, porém, se esquecem que eles podem ter seus próprios sonhos, que podem ser remodelados e mudados, mas mesmo assim visarem a um futuro próspero para a companhia", explicou Davis, também presidente do Owner Managed Business Institute, nesta sexta-feira, 29 de setembro, no último dia do Special Management Program, realizado pela HSM, no Hotel Transamérica, em São Paulo.
De acordo com o professor, não se pode viver com o sonho de outra pessoa e, caso essa visão seja imposta ao sucessor, as conseqüências podem ser perigosas. "Um líder precisa de seus próprios desejos, caso contrário será uma pessoa desmotivada e sem confiança para o futuro", salientou.
Pense com antecedência - Para Davis, a sucessão é algo que deve ser pensado com uma boa antecedência. Assim, as companhias evitam traumas perigosos, como a morte repentina de um líder centralizador e as conseqüentes mazelas deste acontecimento. Para ilustrar tal ensinamento, o professor apresentou um exemplo acontecido em uma concessionária, nos Estados Unidos: "o proprietário e criador dessa companhia, chamado 'Ernie', conseguiu convencer suas duas filhas e genros de que precisava ensiná-las o ofício de gerenciar a companhia, para o momento em que ele não mais estivesse lá. Assim, eles passaram a se reunir de três em três meses em encontros onde discutiam o que fariam sem Ernie no momento em que não pudessem mais contar com ele. Isso tudo com o próprio dono da empresa supervisionando as reuniões e dando dicas."
Este é um exemplo de liderança corajosa e carinhosa para com os sucessores. "Gostaria que todas as empresas pudessem tê-lo como um modelo de sucessão. Com uma liderança assim, os resultados são melhores, e os riscos desnecessários, evitados", enalteceu Davis.
Desafios - Além dos temas citados, outros fatores também devem ser levados em conta e analisados no momento de uma sucessão. Um instante-chave é quando a família pondera quando é o caso de se pensar em recrutar alguém de fora do círculo familiar para ocupar o cargo mais alto da empresa.
De acordo com Davis, essa medida deve ser tomada apenas em momentos extremos, como quando a família está dividida ou no momento em que não há um sucessor em condições para assumir o posto. "O ideal, porém, é usar um membro da família para o cargo de presidente, enquanto que para a posição de chefe do conselho administrativo, uma pessoa de fora do círculo familiar é essencial", explicou.
Outro risco, segundo o palestrante, é a dificuldade de um membro da família julgar com precisão as qualidades de seu sucessor. "Devido a uma série de fatores emocionais, não é fácil para um dono de empresa analisar com justiça um outro membro da família. Por isso, nesse momento é muito importante a influência de uma terceira parte para uma avaliação objetiva do caso", explicou.
O momento certo de mudar - Outro elemento-chave é a escolha de qual o momento certo de passar o bastão para a próxima geração. Além dos resultados da empresa, outros elementos devem ser levados em conta, como a motivação do líder e as qualificações e motivações do potencial sucessor.
"São necessários discernimento e muita maturidade por parte do líder para saber o momento certo de descer", explicou Davis. Aí se encaixam os quatro perfis de líderes listados pelo palestrante:
O Monarca - não abre mão de seu posto
O General - abre mão em certo momento, para retornar depois
O Embaixador - retira-se de seu posto para depois assessorar o sucessor
O Governador - retira-se e nunca mais volta
Segundo Davis, mesmo nos casos mais extremos acima, o conselho administrativo deve saber lidar com o perfil do líder, e tentar, mesmo que de maneira política, fazer com que este abra espaço aos poucos para as próximas gerações. "O maior teste de liderança é como transmitimos um legado saudável e a própria liderança", sentenciou.
Aprenda a gerenciar o dinheiro - Davis trouxe aos participantes também uma visão importante sobre como gerenciar bem os recursos da empresa para com os acionistas. Segundo ele, uma dica importante é avaliar bem para depois lidar com as diferentes necessidades dos acionistas.
"A lição que fica é não deixar que as necessidades financeiras de alguns acionistas determinem as políticas de remuneração e reembolso da empresa", advertiu o professor. "Uma alternativa para isso é a criação de fundos de ousadia prudente, ou seja, um repasse de dividendos proporcional para cada acionista, mas linear, ou seja, que não oscile nem com um momento de maior produtividade e lucro da companhia, nem com um momento de crise", sugeriu.
Os 10 Mandamentos - Para encerrar, Davis listou as dez regras essenciais para uma gestão de sucesso de um sistema de empresa familiar:
1. Atenda as necessidades das esferas da "Família", "Propriedade" e "Negócios" regularmente
2. Fortaleça o compromisso entre a família e seu negócio
3. Crie confiança, orgulho, talento e dinheiro
4. Trate seu negócio como negócio e sua família como família
5. Forme uma equipe de "guardiões" entre os proprietários
6. Preze a harmonia, mas construa unidade
7. Tome decisões e faça mudanças realistas e oportunas
8. Planeje com antecipação e seja flexível
9. Torne a estrutura sua aliada
10. Adote uma perspectiva de longo prazo
Davis deu um alerta para aqueles que ainda hesitam em abrir espaço para uma sucessão em suas empresas familiares. "Uma geração raramente é suficiente para realizar grandes feitos. Plantamos o que colhemos. O que você faz hoje faz o amanhã", alertou.

Exemplo de pioneirismo em empresas familiares

Criada em 1957, quando o radialista Maurício Sirotsky Sobrinho associou-se a Rádio Gaúcha, a Rede RBS é atualmente o maior grupo de comunicação regional do Brasil, com mais de cinco mil colaboradores, atuando em jornais, emissoras de TV e rádio.
Porém, antes de atingir esse patamar, a companhia teve de lidar com um instante crítico em sua história: a morte de Maurício Sirotsky, em 1986. "Foi o momento mais difícil na história da empresa, pois o falecimento dele foi repentino e pegou todos de surpresa", disse Eduardo, um dos membros da terceira geração da família.
Apesar do súbito falecimento pegar todos desprevenidos, Eduardo destacou que a decisão tomada à época foi acertada, e trouxe benefícios inestimáveis para o futuro. "A companhia tinha a opção de colocar o filho de Maurício no poder, ou então empossar Jayme Sirotsky, seu irmão, que detinha uma parcela minoritária no controle da empresa", contou Eduardo. "Foi o que fizeram e, naquele momento, era a decisão mais certa, já que deram tempo para que a sucessão de Maurício acontecesse no instante certo, quando seu filho estava pronto para assumir a função, seis anos depois", ponderou.
Gestão em família - Ingresso nos negócios da empresa no momento em que a globalização e o boom da internet impunham novos desafios para o grupo, Eduardo é atualmente o presidente do conselho de família da empresa, que segundo ele é de suma importância esse braço dentro da RBS.
"Reunimos freqüentemente nossa família para tratar de assuntos ligados à empresa. Isso é importantíssimo para o prosseguimento de um negócio familiar, pois assim conseguimos envolver todos num sentimento comum", explicou.
Eduardo foi um dos responsáveis por reestruturar o meio executivo da empresa, deixando o conselho administrativo e a diretoria executiva com vários membros de fora do âmbito familiar. "Porém, trabalhamos para que a Rede RBS continue sempre sendo uma empresa familiar, pois acreditamos nesse modelo corporativo", concluiu.
Restrições a familiares - Outro recurso adotado pela RBS foi a imposição de regras para que membros da família pudessem trabalhar na corporação. De acordo com Eduardo, foi imposta uma cartilha com preceitos que os familiares devem ter. Tais regras, segundo ele, são muito parecidas com os "Padrões de Barcelona", citados por John Davis no primeiro dia de palestra. Esses padrões criados por uma companhia catalã exigem, dentre outras coisas, experiência de gestão e formação superior de todos os candidatos.
"Eu mesmo, quando fui convidado a trabalhar na empresa, tive de passar por uma entrevista e análise de currículo", contou Eduardo, que foi indicado ao cargo por Pedro Parente, um dos braços-direitos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso durante seu mandato, e atualmente é vice-presidente executivo da companhia.
Segundo Eduardo Sirotsky Melzer, a RBS, hoje, emprega apenas quatro membros da família em seu quadro de colaboradores.

Exemplo de recuperação de uma empresa de família
O professor de Family Business da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing), Eduardo Najjar, trouxe nesta quinta-feira, 28 de setembro, aos participantes do Special Management Program, que está sendo realizado pela HSM, no Hotel Transamérica, em São Paulo, um exemplo claro de como é possível uma empresa de origem familiar, com sérios problemas internos, se reerguer.
Najjar apresentou o case real da companhia "Super" - nome fictício para proteger a identidade de seus proprietários -, uma rede de varejo de São Paulo, que conta com um hipermercado e outras sete lojas espalhadas pelo Estado. Devido a uma falta de planejamento estratégico acerca de questões familiares, a empresa, criada em 1956, passou a sofrer com a desunião dos membros da família a partir do falecimento de uma das principais gestoras da rede. "Eles sofriam com uma série de problemas, como dispersão física dos familiares, pressão da terceira geração para assumir os negócios, idade avançada dos gestores, desunião, falta de comprometimento gerencial, dentre outros fatores", contou o professor.
O resultado para esses problemas, que começaram a acontecer em meados dos anos 80, foram anos de resultados negativos, perda de mercado para concorrentes e diminuição da margem de lucro. Enquanto esses resultados ruins apareciam, o conselho mostrava-se rachado internamente, com a formação de diferentes grupos dentro da empresa e do início de uma disputa interna por poder, conseqüência da falta de confiança entre os membros da família.
"Para tratar desse problema, realizamos ações em meio à família, aos negócios, aos funcionários e às finanças corporativas", conta Najjar. "Elaboramos e fizemos os acionistas assinarem um acordo que previa, dentre outros elementos, a necessidade de uma postura melhor entre os sócios, a universalização das informações, regras para o ingresso da terceira geração nos negócios e uma avaliação criteriosa e regular da empresa", listou.
Com isso, foi criado um código de ética dentre da rede "Super", que passou a funcionar ao lado do acordo assinado entre os acionistas. Foi criado também um conselho de família, que passou a atuar junto ao conselho administrativo da empresa. "Com isso, ainda faltando três meses para o término do projeto, conseguimos recuperar a margem de lucro, revitalizar o crescimento da companhia e integrar as equipes, além de ampliar a informatização da empresa, acabando assim com o amadorismo", concluiu Najjar.

Fonte: http://www.hsm.com.br/canais/coberturadeeventos/SMPDavis2006/smpdavis1_280906.php?mace2_cod=173&pess2_cod=66732&lenc2_cod=

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