segunda-feira, novembro 06, 2006

O começo de todas as possibilidades

O especialista de mercado da China Ming-Jer Chen oferece algumas chaves para fazer negócios com empresas daquele país. O ponto de partida? Fazer uma rede de conexões pessoais e comerciais.
Networking e guanxi - Um executivo americano queria expandir sua empresa para a China. Entendendo que manter um bom relacionamento com o governo local era vital para o sucesso de seu negócio, ofereceu jantares para vários funcionários do governo. Durante seus primeiros seis meses na China dedicou-se a oferecer uma série de luxuosos banquetes.
Inevitavelmente, seu negócio esbarrou em uma ocasião, com empecilhos burocráticos locais, e em busca de ajuda o empresário dirigiu-se àqueles que havia convidado aos jantares. Para sua surpresa, nenhum desses funcionários do governo se mexeu para ajudá-lo. Ele sabia que eles podiam resolver o problema, mas eles disseram que não o fariam com diferentes argumentos. Este empresário sentiu-se paralisado e chateado ao mesmo tempo, pois tinha investido tempo e dinheiro construindo o que imaginou ser guanxi com esses funcionários.
Em seu livro Inside Chinese Business (Harvard Business School Press, 2001) o especialista em relações entre Oriente e Ocidente Ming-Jer Chen explica que o erro que aquele executivo cometeu foi pensar que o guanxi podia ser estabelecido simplesmente organizando banquetes, uma falsa percepção muito comum no Ocidente. Porém, para os olhos de seus convidados ele era um "amigo de vinhos e jantares", uma pessoa que faz um show da amizade, mas cujo compromisso com seus amigos é, na verdade, superficial.
Os chineses têm fama de apreciar a boa comida e para eles jantar com amigo é algo sério. Mas a sinceridade da sua amizade é ainda mais importante. Qualquer pessoa pode pagar um jantar, mas apenas podemos ter confiança em um verdadeiro amigo nos bons e maus momentos da vida e isto também significa fazer acordos comerciais, por isso os chineses procuram seus amigos e conhecidos de toda vida para sociedades comerciais.
Para Chen, em contraste com as relações ocidentais baseadas nas cultura comercial, a sociedade de negócios chinesa está centrada nas relações. No contexto de negócios chinês, as relações são uma forma de capital social, propriedade das pessoas de negócios e associados com a empresa que gerenciam. Enquanto um ocidental de sucesso chama-se a si mesmo “rico", no contexto chinês ela ou ele se descreve como "bem conectado". Este fenômeno levou a renomada revista The Economist a descrever o guanxi como o "principal bem" da maioria das empresas chinesas.
O guanxi, recebeu grande atenção dos meios ocidentais. Mas não existe uma tradução que transmita com exatidão em português a sua essência. Convencionalmente se explica como "conexão", mas esta palavra apenas aborda um único aspecto de seu significado.
Guanxi consiste em fazer conexões, mas mais especificamente se concentra naquelas que estão definidas pela reciprocidade e pelas obrigações mútuas. De acordo com Chen, idealmente, essas conexões também estão sustentadas por um senso de benevolência e afeição pessoal.
Em Inside Chinese Business, Chen aprofunda a questão. Para ele, claro que todas as culturas dependem da rede informal em algum ponto: em japonês, o wa, em coreano inhwa, em inglês é o laço com a velha escola, nos Estados Unidos, o country club, todos elas dão para os membros de seu grupo a confiança e privacidade necessárias para fortalecer as transações comerciais. Guanxi, no entanto, difere de ambos por sua permanência e sua ênfase nos laços familiares e nas experiências compartilhadas.
Ren zhe ren ye - Fixado a esta frase encontra-se um universo de sentido que revela como os chineses se vêem a si mesmos e seu relacionamento com os outros. "O sentido de pessoa é ren." O terceiro caractere, transcrito como ren, significa humanidade, e também coração ou semente de fruta. O caractere ren é composto pelos caracteres utilizados para "dois" e para "pessoa". A etimologia ("duas pessoas") sugere que, no contexto chinês, nenhuma pessoa existe senão com relação à outra, e esta relação é o começo de todas as possibilidades.
Cultivar o guanxi - Existem diferentes formas de cultivar o guanxi. Os ocidentais que desejam entrar na cultura de negócios chinesa, indica Chen, costumam se deparar com um mundo onde as relações pessoais determinam muito do que acontece, onde cada indivíduo tem sua própria rede de conhecidos e conexões e onde cada rede individual é uma entre as centenas de redes de graus variados de intensidade, entrelaçadas. Muitas das quais são invisíveis para o observador externo. Isto, confrontado com um ambiente de negócios opaco, faz com que os recém chegados se sintam perdidos, até começar a cultivar sua própria rede de relações.
Em princípio, tanto os chineses educados em Ocidente como os imigrantes daquele país, podem ser um valioso capital de rede se a empresa está tentando fazer negócios na China, especialmente se conservam seus contatos sociais e culturais na Ásia. Sua familiaridade com ambas culturas e formas de fazer negócios pode oferecer um importante nexo entre Leste e Oeste. Inúmeras empresas conseguiram entrar no mercado de chinês através de terceiras partes bi-culturais.
De acordo com a perspectiva de Chen, ao se reunir pela primeira vez com seu provável sócio, os tipos de perguntas vão revelar o interesse em estabelecer pontos em comum. Enquanto muitos ocidentais começam perguntando sobre a profissão, os chineses perguntam em que lugar você mora. As perguntas têm como propósito localizar você em seu contexto social e estabelecer se existe a conexão suficiente para uma potencial colaboração.
Apesar de sua aparência de reticentes em realizar acordos com terceiros, os chineses estão muito ansiosos por estabelecer conexões com as pessoas que conhecem. A descoberta de ancestrais ou lugares de nascimento em comum tem maior peso no contexto chinês do que em Ocidente. Enquanto um ocidental pode se deleitar descobrindo que um novo conhecido foi na mesma escola primária, ou que seus pais moram na mesma cidade, os chineses situam essas descobertas no mesmo marco do lao xiang ("compatriota" ou "antiga família") colocando o conhecido no círculo mais íntimo dos relacionamentos.
Durante as etapas iniciais de uma relação, mostrar interesse no passado do novo conhecido pode facilitar o desenvolvimento do guanxi. Se por exemplo, um novo conhecido chinês menciona que estudou numa universidade estrangeira, pergunte sobre suas experiências e tente estabelecer pontos em comum. Esses pequenos gestos podem ser importantes signos de interesse e consideração e um primeiro passo para a expansão da guanxi network.
No entanto, é muito importante não ser complacente demais e não cair em loas pouco sinceras para que a relação seja estabelecida rápido demais. Nas palavras de um gestor de Hong Kong: "Não se pode esperar que os pára-quedistas cheguem e tenham guanxi na hora". De fato, pode levar alguns anos construir uma relação com os chineses. Entre as ações bem recebidas estão: visitar os escritórios da firma chinesa por conta própria, recebê-los no seu, buscar informação sobre o passado de quem quer ser seu sócio e também pensar que temas de conversação preferem e até que tipo de comida eles apreciam mais.
De forma geral, se os associados chineses percebem que você está tentando pegar atalhos para construir guanxi, seja apressando as coisas ou sendo pouco sincero com eles, será muito difícil que o negócio prospere.
Então é bom organizar jantares para seus sócios chineses? Pergunta Chen. É claro que sim, mas esteja certo de que esses jantares estejam acompanhados de gestos que expressem seu sincero interesse neles e de demonstrar seu compromisso em desenvolver um relacionamento profundo.
Fonte: © Carta de Noticias, 2006 em 31/10/2006

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