quinta-feira, novembro 16, 2006

Receita ideal para comandar

Democráticos, dirigentes, treinadores. Os líderes brasileiros não devem nada aos melhores profissionais do mundo quando o assunto é estilo de liderança. Pesquisa inédita realizada pelo Hay Group com executivos brasileiros e seus subordinados diretos revela que as características identificadas correspondem à combinação considerada globalmente ideal para quem está no comando. O levantamento mostra ainda como esses talentosos administradores de fato influenciam o clima de suas companhias e o padrão de desempenho de suas equipes.
Um aspecto importante indicado na pesquisa é o alto grau de maturidade desses líderes. A coincidência de sua visão e a de seus colaboradores nas principais características de liderança demonstrou que a maioria possui uma aguçada percepção das próprias competências. "Eles se percebem da mesma forma como são percebidos por suas equipes", diz Glaucy Bocci, consultora sênior do Hay Group, responsável pela pesquisa. Para capitanear uma companhia em um país sujeito a instabilidades políticas e econômicas constantes como o Brasil, esse autoconhecimento é condição sine quanon para o sucesso. "Só o autocontrole garante a estabilidade necessária para lidar com as pressões por resultados em um ambiente tão adverso", diz a consultora.
No levantamento foram ouvidos 81% dos vencedores da sexta edição do prêmio Executivo de Valor, que responderam 68 questões de próprio punho, e 80% dos subordinados, que responderam 217 questionários. A metodologia aplicada foi desenvolvida pela divisão americana McBer do Hay Group. O objetivo foi chegar ao perfil dos estilos utilizados pelos executivos em seis classificações: coercitivo, dirigente, afetivo, democrático, modelador e treinador. Os dados coletados foram comparados a uma representativa amostra do banco de dados mundial da consultoria e transformados em percentis. Quanto maior o percentil, mais um estilo foi considerado dominante em relação aos outros.
As coincidências de avaliações, entre CEO e colaboradores, encontradas em três dos seis estilos gerenciais investigados, demonstram o alto grau de sintonia existente. O estilo democrático foi considerado dominante tanto pelos executivos (75%) como por suas equipes (71%). O que caracteriza este tipo de liderança é justamente a busca do consenso. "O líder ouve as pessoas, faz muitas reuniões e cria um ambiente participativo onde elas se sentem conectadas, inseridas na gestão", diz a consultora. O executivo quando utiliza esse estilo deixa as pessoas agirem sem uma supervisão constante. Confia.
A única crítica ao estilo democrático é sua relutância em dar feedbacks negativos. "A pessoa tem dificuldade em reconhecer desempenhos diferenciados", diz Glaucy. Mas ela lembra que essa característica acaba sendo contrabalançada por outras do estilo dirigente, o segundo mais utilizado na opinião dos CEOs (68%) e dos colaboradores (64%). "A marca dele é ser firme e justo", assinala a consultora. A visão de longo prazo e as metas a serem alcançadas, para eles, são sempre priorizadas. Por conta disso, monitoram o desempenho das pessoas em relação a esses objetivos dando feedbacks específicos. São os "controladores" que garantem que o resultado será perseguido.
Fechando a trinca da combinação de estilos considerada ideal pelo Hay Group, está o treinador. Ele é considerado um estilo dominante para os colaboradores (63%) e de apoio para os CEOs (53%). "Esse estilo se refere a líderes com uma preocupação genuína com o desenvolvimento da equipe no longo prazo", diz a consultora. O treinador é quem senta com os subordinados, discute a carreira e diz no que eles devem melhorar.
A forma como as companhias globais vem trabalhando, organizando-se em estruturas matriciais, faz crescer a necessidade dos executivos terem pessoas bem preparadas a seu redor. "Muitos respondem de uma forma hierárquica no Brasil e de outra funcional para outro país", explica a consultora. Isso gera uma adversidade de situações enorme. São tantas demandas que muitas vezes eles precisariam estar em dois ou três lugares ao mesmo tempo. "Com uma boa equipe, esses CEOs podem delegar o gerenciamento de alguns negócios ", diz. "Quanto menos precisarem se envolver em questões tático operacionais melhor."
Os presidentes pesquisados, entretanto, discordam um pouco de seus colaboradores quando são chamados de treinadores. Eles acreditam estar muito mais conectados ao estilo afetivo (66%). A tônica desse tipo de liderança é colocar sempre as pessoas em primeiro lugar. O líder se empenha em administrar conflitos para criar um clima de harmonia. "Na cultura latina, onde a proximidade com as pessoas é valorizada e até estimulada, características desse estilo como a empatia, o cultivo de relacionamentos e a sensibilidade são importantes", afirma Glaucy.
As habilidades interpessoais do afetivo são hoje bastante desejadas pelo mercado de trabalho. O único porém de sua gestão é a dificuldade em recompensar as pessoas pelo desempenho. No geral, ele gratifica levando em consideração apenas atributos pessoais. "Recebe mais quem ele gosta", diz a consultora. Mas esse não é um estilo predominante entre os executivos de Valor.
"O fato é que não existe estilo melhor ou pior, o bom é ter um repertório vasto. Quanto mais ferramentas o executivo tiver para enfrentar as diferentes situações, melhor", diz a consultora. Em alguns momentos, por exemplo, ele precisará utilizar as habilidades do coercitivo, o quarto estilo de apoio apontado pelos colaboradores (62%) e o quinto na visão do CEO (44%). Ele é o que orienta. Seu objetivo é fazer suas idéias e propostas serem aceitas de imediato. Funciona muito bem na condução de mudanças e sabe como colocar na linha funcionários problemáticos.
"Como os CEOs são muito cobrados por resultados, por mais que eles sejam os que ouvem, clarificam a visão e se preocupam com os outros, acabam em algum momento passando essa pressão para a equipe", diz. "Os coercitivos têm uma maneira mais dura de cobrar do que o dirigente." É como se o executivo fosse um general em um bombardeio. Ele simplesmente não pode toda vez parar e discutir a estratégia com os soldados. Em alguns momentos, precisará tomar uma decisão rápida e sair à frente do pelotão. No campo de batalha, o foco está em objetivos de curto prazo. Isso também acontece no mundo dos negócios.
O tipo de demanda existente hoje nas corporações, segundo Glaucy, requer a utilização mais freqüente dos estilos democrático, diretivo, treinador e coercitivo. Mas para ser um líder de sucesso, dependendo da situação, o executivo utiliza um pouco de todos os seis estilos, incluindo o modelador, apontado em último lugar pelos colaboradores (45%) e pelos CEOs (40%). Esse é o que estabelece altos padrões de referência baseados no próprio trabalho. Acredita ser o melhor exemplo a ser seguido, sempre.
A maneira como o executivo usa suas competências para liderar a organização tem um importante impacto no clima de trabalho das equipes. O Hay Group calcula que ele seja de 70%. E o clima, bom ou ruim, influenciará em até 28% os resultados de uma companhia. "O estilo é um comportamento que gera uma reação, uma percepção das pessoas", diz a consultora. "Ele se relaciona com o desempenho, a motivação."
A pesquisa do Hay Group inclui, além do levantamento dos estilos gerenciais mais usados pelos executivos de Valor, um inventário sobre como essa maneira de comandar influencia o clima de trabalho dos subordinados. Foram elaboradas 47 questões para classificar seis dimensões: flexibilidade, responsabilidade, padrões de desempenho, recompensa, clareza e comprometimento.
A menor diferença entre o clima considerado perfeito e o vivenciado pelos subordinados é sobre os padrões de desempenho. "Para eles, existe coerência no estabelecimento de metas desafiadoras e ao mesmo tempo realistas", diz Glaucy. Nesse caso, o patamar de excelência exigido pelo presidente ajuda a "puxar" a equipe. "É uma combinação entre expectativas e capacidade, tanto da organização quanto dos indivíduos". Esse resultado está diretamente ligado à atitude do líder coercitivo. O implacável na cobrança de resultados e o imprescindível em momentos de crise quando as manobras exigem maior rapidez.
Outra dimensão de clima bem atendida pelo estilo dos CEOs na opinião dos subordinados, é o comprometimento da equipe. "Essa percepção inclui o orgulho do trabalho, a busca de um objetivo comum e a cooperação", diz Glaucy. Isso mostra o quanto os executivos de Valor conseguem manter suas equipes alinhadas. O clima de clareza e de responsabilidade também são favoráveis e estão próximos do ideal aos olhos das equipes. "Eles estão satisfeitos com o grau de autonomia atribuído a eles e com a maneira como são responsabilizados pelos resultados", diz a consultora. Dois aspectos que remetem ao perfil de liderança do dirigente. O que sabe dividir bem os papéis e definir a missão da companhia olhando para o futuro.
A recompensa é um aspecto do clima que ainda está um pouco aquém da expectativa na visão de quem se reporta diretamente ao CEO. Trata-se do reconhecimento ao desempenho não necessariamente financeiro. "Eles querem mais apoio à tomada de decisões, feedback, elogios, desenvolvimento", diz a consultora. O líder democrático - estilo predominante apontado pela pesquisa - tem problemas para fazer essa diferenciação por performance. Sua tendência é sempre socializar, criar participação, consenso e não personalizar resultados.
A dimensão menos atendida em relação ao clima é a flexibilidade. Os colaboradores reclamam do nível de burocracia desnecessária e da forma como ela atrapalha os processos de inovação. Em um mercado instável, segundo a consultora, os CEOs acabam mais envolvidos em processos de decisão para garantir resultados aos acionistas, o que pode passar para a equipe a sensação de um controle exagerado.
No geral, o estudo do clima mostrou que os estilos gerenciais dos executivos brasileiros têm ajudado a manter a unidade em suas equipes. A preocupação em construir times eficazes é uma característica dos melhores executivos do mundo. Pesquisa conduzida pelo Hay Group com presidentes das 100 companhias com melhor desempenho, de diversos setores da economia, na Índia, mostrou que eles têm a mesma preocupação dos brasileiros com a formação de equipes. "Eles sabem delegar com responsabilidade, dão autonomia para isso", diz a consultora.
Outro ponto em comum entre os nossos primeiros homens e os da Índia, é a maturidade. "O autoconhecimento deles é significativo assim como o apresentado pelos nossos executivos", diz. Essa característica demonstra o quanto os nossos líderes estão conectados com eles próprios e o quanto conseguem gerenciar os impactos de seus comportamentos junto aos seus interlocutores. Para quem vive em um ambiente de alta pressão, quanto maior for o conhecimento de seus limites, mais fácil será gerenciar em diferentes situações.
Fonte: Stela Campos da revista Executivo de Valor em 16/11/2006 publicado na Revista Digital - uma publicação on-line da Pólo RS - Agência de Desenvolvimento

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